segunda-feira, 14 de junho de 2010

Profissionalização na Gestão_1º Setor

Governo S/A
A administração pública aposta em estratégias de gestão de empresas privadas para modernizar a máquina, gastar menos e atender melhor. Os resultados já aparecem.
Por Rodolfo Borges

Se você acredita que a morosidade do setor público brasileiro é incorrigível, eis uma boa notícia. No dia 19 de abril, o IBGE resolveu incluir um novo endereço entre os sete mil postos de coleta de dados do Censo 2010: o primeiro andar de um edifício na avenida Presidente Vargas, em Estância Velha (RS). Três dias depois, estava fechado o contrato de aluguel. Até recentemente, esse processo levaria pelo menos um mês para ser concluído. A agilidade na locação é apenas um dos frutos do programa de melhorias de gestão implantado pelo instituto de estatística em 2008.

Com foco em planejamento estratégico, desenvolvimento de lideranças e melhoria no atendimento, o programa insere o IBGE num seleto grupo de órgãos oficiais que têm utilizado modelos consagrados na iniciativa privada para aumentar a eficiência da administração pública. Práticas mais modernas já são sentidas no INSS, nas Forças Armadas, na Embrapa , no STJ e na Anvisa, entre outros. Além de tempo, há economia de recursos preciosos. “Reduzimos o custo de alguns processos em 90%”, disse à DINHEIRO o diretor-executivo do IBGE, Sérgio Côrtes.

Não existe milagre. As mudanças são fruto de uma visão de governo que privilegia a profissionalização, avalia o presidente do INSS, Valdir Simão. O instituto passa por uma revolução desde 2006, quando implantou o agendamento eletrônico e acabou com as filas vergonhosas que se formavam, de madrugada, às portas das agências da Previdência Social.

De lá para cá, caiu para 12 dias, no máximo, o tempo de espera por benefícios que levavam anos para sair. A nova política do INSS inclui um plano de ação com 17 indicadores de desempenho. Os gerentes das 1.143 mil agências que não cumprirem o prometido deverão prestar contas.

Simão sabe se eles estão fazendo seu trabalho direito, pois tem em sua sala um painel com informações em tempo real do que acontece nas agências. E sabe tudo: quantas pessoas pegaram senha, há quanto tempo estão esperando, quantas aguardam atendimento. O INSS também disponibiliza na internet dados que antes só eram fornecidos pessoalmente, como extrato de contribuição e simulações de benefícios.

No fundo, há uma guerra entre velhas práticas e novas demandas. “O setor público vive um interessante conflito entre os valores tradicionais, como moralidade, legalidade e impessoalidade, e os novos valores de qualidade, performance e resultado”, analisa o secretário de gestão do Ministério do Planejamento, Tiago Falcão.

As Forças Armadas, por exemplo, trabalham em sistemas para abolir a circulação de papel. A Embrapa, pioneira em planejamento estratégico, implantou um sistema para acompanhar o cumprimento de metas. Mas é no Superior Tribunal de Justiça (STJ) que as medidas causaram maior impacto.

A digitalização dos processos do STJ – pioneira no mundo – eliminou os 13 meses de hiato entre o protocolo e a mesa do ministro. E aumentou a área útil do tribunal em 30%, ao eliminar os armários com a papelada. “Também aposentamos as gaiolas de transporte dos processos, que quebravam 50 portas por mês”, orgulha-se o presidente do STJ, Cesar Asfor Rocha. A transferência para os computadores está sendo feita por 320 deficientes auditivos.

Até o fim de junho, 340 mil processos ganharão o meio virtual. Iniciada em novembro de 2008, a virtualização foi replicada para os tribunais estaduais e federais e apenas o de Minas Gerais, dentre 32, ainda usa papel. O resultado é uma economia de R$ 20 milhões por ano só em transporte dos processos pelos Correios. E queda de 70% nos pedidos de licença médica dos funcionários. “É preciso um pouco de loucura para vencer a burocracia e o medo do novo. Com esses avanços, o burocrata perdeu muito poder”, afirma Asfor Rocha.

As iniciativas são pontuais, mas demonstram a vontade de melhorar um serviço afundado em descrédito. Decretos presidenciais sancionados recentemente atrelam gratificações a avaliações de desempenho individual e impõem a realização de pesquisas de satisfação. Para a professora Andréa Gonçalves, do Departamento de Administração da Universidade de Brasília, os avanços ainda são insuficientes para remover características tradicionais da administração pública. “É por causa do patrimonialismo que as mudanças ocorrem de forma tão lenta”, explica.

Os processos de modernização são acompanhados de perto pelo Ministério do Planejamento. Este espera concluir até 2012 a digitalização das fichas funcionais de 1,6 milhão de funcionários federais. O novo sistema vai permitir acesso imediato aos dados dos servidores e tornar instantâneos processos que levavam meses, como a retirada de um funcionário falecido da folha de pagamento.

“Nossa única diferença para as empresas privadas é que o negócio delas é o lucro e o nosso, o ganho social”, diz Haley Almeida, chefe de planejamento da Agência Nacional de Vigilância Sanitária. A Anvisa trabalha com uma ferramenta de gerenciamento de metas, o Balanced Scorecard, desde 2008. “Temos de regular medicamentos e alimentos. Sem capacidade de operação, não é a Anvisa que corre risco, mas o País”, diz. Para esse novo gestor público, a empresa é o Brasil.

Nenhum comentário:

Postar um comentário